sexta-feira, 2 de março de 2012

Dora.

E os pés, a vida toda esparramados pelo chão seco, terminaram por ressecados também. Falo deles que é neles que punha os olhos ao caminhar. Vinham agora metidos em sandálias avelhentadas que por pouco seriam a terra quente dali. Dum pedaço de pano florido fizera-se o vestido de cortes tortuosos na mesma cor do laço que trazia nos cabelos de sol. Desta vez, o corpo magricela, tocado de um brio jam...ais experimentado, animou-se um tanto mais. Postou, com três dedos de cada mão, as madeixas por trás das orelhas, deixando ver um rosto um tanto moço para aqueles pés. Sentou-se frente à mesa, mirando o caderninho com capa de pano e perguntou à senhora do outro lado sobre o preço. Deixou escapar entre os dedos umas cinco moedas e pôs-se a ditar o que levaria a carta ao amado sertanejo. A senhora registrava palavra a palavra o borboletear ansioso do que havia a moleca a dizer. Posso pegar o papel e a caneta um minutin? Agarrou, desengonçada, a caneta e desenhou cheia de si: Doralice.

Um comentário:

  1. Legal ver uma estrutura gramática erudita tratando de uma questão popular. Deu o tom - que os bestas que precisam de tom querem -junto a uma boa articulação de idéias para conseguir trazer beleza - de uma maneira ou de outra - a atitudes simples. A dificuldade de se considerar a cultura popular sempre veio de preconceitos intrínsecos, mas também de uma masturbação por parte da academia com os eruditos. Esse tom não é problema. Ele por ele, talvez fosse. Ele abordando a vida popular, iguala ela às outras vidas geralmente mais valorizadas culturalmente... Pior ainda é que muitas universidades a ignoram em vários âmbitos artísticos(como é o caso de diversas faculdades de música, por exemplo) e mesmo assim, coisas de péssimo teor ganham importância burocratizada: Isso a um nível de Sarney fazer parte da Academia brasileira de letras, por exemplo... Gostei. =]

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